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Desembargador decide colocar dois coronéis da PM em liberdade
O desembargador Orlando Perri, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, decidiu, há pouco, revogar as prisões preventivas dos coronéis Evandro Alexandre Lesco e Ronelson Barros, ex-chefe e ex-adjunto da Casa Militar, respectivamente.
O magistrado resolveu colocar os oficiais militares em prisão domiciliar, além de definir várias medidas cautelares.
Entre as medidas, estão o uso de tornozeleira eletrônica, o afastamento de suas funções institucionais, a proibição de entrar em contato com outros réus e testemunahs e de se ausentar da Comarca de Cuiabá.
Os dois são acusados de participar de um esquema de escutas telefônicas ilegais em Mato Grosso. Ambos haviam sido presos no dia 23 de junho por ordem do próprio Perri.
O suposto esquema era viabilizado pela prática da “barriga de aluguel”, quando números de telefones de cidadãos comuns, sem conexão com uma investigação, são inseridos em um pedido de quebra de sigilo telefônico à Justiça.
Barros está detido no Batalhão de Operação Policiais Especiais (Bope), enquanto Lesco está sob custódia na Academia de Polícia Costa Verde.
Também são réus na ação penal os coronéis Zaqueu Barbosa e Januário Batista e o cabo Gerson Correa Junior. Zaqueu e Gerson continuam presos.
Participação “não tão incisiva”
Ao converter as prisões preventivas em domiciliares, Perri explicou que a apesar dos “indícios concretos e seguros” da ligação de Lesco e Barros com o esquema, “a participação de ambos não foi tão incisiva e direta para o sucesso da empreitada criminosa, nomeadamente no que tange às escutas telefônicas ilegais”.
O magistrado relatou que, quanto ao coronel Lesco, foi apurado até o momento duas situações: a primeira quando ele apresentou ao coronel Zaqueu dois de seus experts na área de inteligência. A segunda ao fornecer a folha de cheque para adquirir o Sistema Sentinela e também ao se responsabilizar pelos aluguéis da sala onde ocorriam as escutas.
“Até o atual estágio das investigações, não há provas materiais e concretas de que o Cel. PM Lesco tenha tido acesso aos dialogos interceptados, ou que ele fosse o responsável por ouvir clandestinamente alguma das vítimas”.
Em relação ao coronel Ronelson Barros, o desembargador afirmou que há indícios de que este prestou “auxílio intelectual” ao grupo criminoso e que chegou a integrar o grupo de WhatsApp do Sistema Sentinela.
“Embora não tivesse autorização para ouvir os diálogos interceptados, ele também integrava, sabe-se lá a que título e para qual finalidade, o aludido grupo”.
Perri citou que, ainda que a participação de Barros tenha sido mais ativa do que a de Lesco, igualmente não há indicativos seguros de que o primeiro tenha efetivamente “atuado na captação de escutas telefônicas clandestinas, seja elaborando fictícios relatórios de inteligência, seja recebendo documentos confeccionados pelo Cb PM Gerson Correa, ou, mesmo, obtendo informações de possíveis diálogos interceptados”.
“Por todas estas razões, apesar da existência de prova do fato delituoso e dos indícios suficientes de autoria, não visualizo subsistentes os motivos autorizadores da prisão cautelar, no respeitante ao periculum libertatis, apenas em relação ao Cel. PM Evandro Alexandre Ferraz Lesco e ao Cel. PM Ronelson Jorge de Barros”.
Cautelares
Conforme a decisão, Perri afirmou que é imprescindível que os dois coronéis não mantenham contato com os demais réus e testemunhas da investigação, “para o fim de evitar prejuízo à instrução processual”.
Para exemplificar, o desembargador citou uma situação relatada pelo cabo Euclides Torezan, que também é investigado e chegou a ser preso por conta do esquema – mas também foi solto por ordem dele.
“Euclides Torezan, na audiência de custódia […] afirmou que se encontrou com o Cel. PM Ronelson Jorge de Barros, no estacionamento da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, e este [Ronelson] o orientou a procurar o Cb. PM Gerson Correa, que estava preso, para alinhavar suas versões, sobretudo para evitar qualquer pronunciamento quanto à existência do Sistema Sentinela”, disse Perri, citando o sistema responsável por operar as escutas.
Para Perri, a prisão domiciliar é a medida ideal para os dois coronéis, uma vez que se continuassem a exercer regularmente suas funções, “por óbvio que a fiscalização das medidas ora impostas seria praticamente impossível”.
“A prisão domiciliar se patenteia indispensável, pois caso continuem em plena atividade, os coronéis Lesco e Barros poderão, até pelo princípio da hierarquia e da disciplina, influenciar na apuração dos fatos, e na própria instrução criminal, pois poderão coagir ou intimidar os corréus e as testemunhas que também sejam militares de hierarquia inferior, o que não pode ser admitido, nem por remotíssima hipótese”.
Desta forma, o magistrado fixou seis medidas cautelares para que os coronéis possam permanecer no regime domiciliar: suspensão do exercício das funções; proibição de frequentar setores que atuam na área de inteligência da Polícia Militar do Estado, como Gaeco e Casa Militar; proibição de se ausentar de Cuiabá; proibição de sair do País, devendo entregar o passaporte em até 24 horas; proibição de manter qualquer tipo de contato com outros réus e testemunhas, seja pessoalmente, por telefone, WhatsApp; e monitoramento por tornozeleira eletrônica.
A denúncia
De acordo com a denúncia do chefe do MPE, procurador Mauro Curvo, Zaqueu era o líder da organização criminosa e criou um Núcleo de Inteligência da Polícia Militar para operar as interceptações clandestinas por meio da barriga de aluguel.
Na organização, conforme o MPE, o coronel Evandro Lesco tinha a incumbência de garantir a estruturação do núcleo através do coronel Ronelson Barros.
Já os cabos Gerson Corrêa e Euclides Torezan tinham a missão de “garantir a elaboração de projeto que assegurasse a viabilidade técnica de funcionamento dos equipamentos que seriam empregados nas escutas ilegais”.
Apesar de o Núcleo de Inteligência ter sido criado com o alegado intuito de investigar policiais militares envolvidos na prática de crimes, o MPE afirmou que tal núcleo também foi usado para interferir na eleição majoritária.
Entre as personalidades grampeadas, conforme as investigações, estavam a deputada Janaina Riva (PMDB); o jornalista José Marcondes “Muvuca”, então candidato ao Governo; e o advogado José do Patrocínio, coordenador jurídico do à época candidato Lúdio Cabral (PT).
Também consta na denúncia do MPE que Zaqueu, Barros e Corrêa falsificaram documentos para obter autorização de quebras de sigilo telefônico pela Justiça.
No caso em questão, a inserção ilegal ocorreu em uma investigação que tramita na Comarca de Cáceres (225 km a Oeste de Cuiabá), envolvendo policiais que estariam colaborando com traficantes da região.
Segundo o chefe do Ministério Público Estadual (MPE), a fraude praticada por Zaque e Correa teria induzido o promotor e o juiz da região a erro, uma vez que acreditaram que números inseridos ilegalmente pertenciam aos alvos da investigação.
Mauro Curvo afirmou que os crimes, cometidos mais de sete vezes, foram provados por meio de relatórios técnicos e depoimentos colhidos na investigação.
O MPE afirmou que o Núcleo de Inteligência que operava as escutas ilegais foi criado pelo coronelr Zaqueu Barbosa, em agosto de 2014, de forma ilegal, “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.
Segundo Curvo, da criação do núcleo até dezembro de 2015, Zaque, Ronelson e Corrêa se uniram para falsificar documentos, com o objetivo de conseguir fazer as escutas clandestinas, “atentando contra a Administração e o Serviço Militar”.
Além disso, Mauro Curvo explicou que o núcleo precisaria ter sua criação homologada por parecer da Diretoria da Agência Central de Inteligência (DACI), para que ficasse subordinado às companhias de Polícia Militar, o que não ocorreu.
Texto: Mídia News