Denúncia diz que renovação da concessão de incentivos ocorreu por causa de unidade em Sorriso

Após a deflagração da Operação Zaqueus, que desbaratou um esquema de pagamento de propina da empresa Caramuru Alimentos S/A a agentes de tributos da Sefaz, a Delegacia Fazendária (Defaz) admitiu que focará a investigação que envolve a empresa em outra denúncia: a de esquema de fraude na concessão de incentivos fiscais, na gestão do ex-governador Silval Barbosa (PMDB).

As investigações resultarão na segunda fase da Operação Zaqueus, iniciada após uma denúncia feita durante a campanha a prefeito de Cuiabá, no ano passado.

A divulgação de uma gravação de áudio em que Bárbara Pinheiro, cunhada de Emanuel Pinheiro (PMDB), admitiria que recebeu dinheiro para ajudar a Caramuru a obter os incentivos fiscais é a base desta nova fase.

“São investigações distintas. Este esquema que foi desbaratado (na primeira fase) não apresenta relação com a denúncia feita na campanha eleitoral. Mas podemos dizer que as investigações sobre incentivos fiscais da Caramuru, com base na denúncia, estão tramitando normalmente e, possivelmente, num dado prazo, já estaremos apresentando seus resultados também”, afirmou a delegada Maria Alice Amorim Barros, titular da Defaz.

A reportagem apurou que a delegacia já recebeu documentos bancários, com quebra de sigilos e outras informações, relacionados a pessoas suspeitas de participação no eventual esquema.

Em uma gravação feita por Elias Santos, irmão de Wilson Santos (PSDB), Bárbara Pinheiro disse que sua irmã, a advogada Fabíola de Cássia Noronha, recebeu R$ 2 milhões da empresa. E, com a sua parte, ela cobriu os prejuízos de uma cozinha industrial que mantinham, pagando factorings onde ela tinha obtido empréstimos.

No áudio, Bárbara disse que foi junto com seu marido, Marco Polo Pinheiro, irmão de Emanuel, conhecido como Popó, à Secretaria de Estado de Indústria e Comércio para conseguir acelerar o processo de enquadramento da Caramuru no programa de incentivos fiscais. Segundo as informações, a empresa tentava obter os benefícios desde 2011.

“Fui lá na secretaria, marquei. Eles foram e fizeram reunião. Uma reunião eu fui junto, nas outras eu não fui. Não é nada ilegal. O que eu consegui lá dentro muitas empresas já fizeram isso”, afirmou.

Segundo o relato de Bárbara Pinheiro, após a ajuda dela para enquadrar a Caramuru nos incentivos, a empresa cobriu parte do prejuízo que ela tinha em suas empresas.

“Fiz a operação e a Fabíola [de Cássia Noronha, irmã de Bárbara] recebeu R$ 2 milhões. Aí, era para fazer pelo escritório dela, só que o escritório dela não é simples. Daí, ela queria que eu mandasse pros escritórios (…) Dei pros escritórios e eles pagaram. Fabíola ficou com o dinheiro dela, e o que era meu paguei as contas da cozinha”, disse.

De acordo com um dos delegados da Defaz, o “modus operandi” das suspeitas sobre os incentivos fiscais da Caramuru é semelhante ao do esquema deflagrado nesta semana.

Nesta primeira fase, a delegacia apurou que agentes de tributos conseguiram diminuir as dívidas da Caramuru com a Sefaz de R$ 65,9 milhões para R$ 315 mil, mediante propina R$ 1,8 milhão. Para isso, eles teriam usado o advogado Themystocles Ney de Azevedo de Figueiredo para “lavar” a propina, simulando contrato de prestação de serviços.

Foram presos os agentes de tributos André Neves Fantoni, Alfredo Menezes Mattos Junior e Farley Coelho Moutinho.

Na investigação relacionada aos incentivos, conforme o que o delegado já apurou, teria ocorrido o mesmo. A suposta propina recebida para a concessão dos incentivos também teria sido lavada por meio de contratos fictícios, no caso, a empresa pagava para um escritório, que distribuía a propina aos beneficiários.

Gravação

As fraudes supostamente envolvendo a Caramuru Alimentos, e os empresários Marco Polo Pinheiro e Bárbara Pinheiro virou o principal tema da eleições em Cuiabá, quando o candidato Wilson Santos divulgou a gravação em que ambos falam sobre uma “consultoria” à empresa.

Eles teriam sido beneficiados por meio de propina, ao conseguir acelerar o processo de concessão dos benefícios fiscais.

A Caramuru Alimentos entrou com pedido de enquadramento no Prodeic (Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso) em 2010, por meio de três empresas, com sedes nos municípios de Água Boa, Querência e Canarana.

A aprovação do processo, porém, se deu em setembro de 2014, durante a gestão de Silval Barbosa (PMDB). Na ocasião, o secretário de Indústria e Comércio era Alan Zanatta (PMDB), indicado pelo então deputado federal, e hoje senador, Wellington Fagundes (PR).

No áudio, Bárbara teria admitido que acompanhou o processo da Caramuru junto ao Cedem (Conselho Estadual de Desenvolvimento Empresarial), então presidido por Zanatta.

“A única coisa que eu fiz, fiquei indo, sim, lá pra ver, ficando vendo (sic) no Cedem, para andar”, disse, na gravação.

Em outro trecho ela diz: “Nós não demos um real pra ninguém, não corrompi agente público”.

“Consultoria foi legal”

Segundo a denúncia feita à Defaz por Wilson Santos, como recompensa pela suposta agilização do processo, a Caramuru teria pago propina por meio de notas fiscais, emitidas a título de “consultoria” pelas empresas de Popó e Bárbara, além de sua irmã, a advogada Fabíola de Cássia Noronha.

Em nota à imprensa, Bárbara Pinheiro disse que prestou consultoria junto com sua irmã à Caramuru. Segundo ela, o trabalho foi “totalmente legal”.

Uma auditoria feita pela Controladoria Geral do Estado (CGE), em fevereiro de 2015, constatou uma série de irregularidades no processo de concessão de benefícios à empresa, com “vícios materiais e formais insanáveis”.

Em função disso, todos os atos de enquadramento e concessão de incentivos à empresa foram anulados, em fevereiro deste ano, pelo Governo do Estado.

Da mesma forma, a advogada Fabíola Noronha negou ter integrado qualquer esquema e reiterou que prestou serviços para projetos de viabilidade financeira e consultoria econômica à Caramuru.

“Em nenhum momento, friso, em nenhum momento recebemos propina ou fomos assediadas para tal. Recebemos algo lícito, fruto de nossa expertise e trabalho prestado. Qualquer especulação em sentido contrário não passa de uma ilação […] Nossos honorários recebidos são, portanto, absolutamente adstritos à atividade técnica, honrada e profissional. Os honorários perfazem cerca de 2% do projeto global, percentual comumente aplicado no mercado de concepção de projetos de viabilidade financeira e consultoria econômica”, disse ela.

Fabíola Noronha também alegou que a inclusão da empresa no Prodeic (Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso) ocorreu no ano de 2010 e foi aditivado em 2014.

Segundo ela, a renovação da concessão dos incentivos “se deu em face de efetivos investimentos por parte da Caramuru em uma nova unidade industrial em Mato Grosso, no município de Sorriso”.

Outro lado

Procurada pela reportagem do Portal Sorriso MT, a empresa disse que foi vítima de extorsão. Confira a nota na íntegra:

A Caramuru Alimentos S/A esclarece que foi vítima de extorsão por parte de agentes públicos e adotou postura corajosa para colaborar com as investigações e corrigir irregularidades.

A empresa se compromete a trabalhar pela consolidação de um ambiente de negócios guiado pela ética, competência técnica e transparência.

Texto: MidiaNews com Portal Sorriso MT