Desembargador: ação de grupo pode ter levado pacientes à morte

O desembargador Alberto Ferreira de Souza, que revogou a ordem de soltura de sete acusados na Operação Sangria, afirmou em sua decisão que apenas as medidas cautelares impostas ao grupo não seriam suficientes para evitar a destruição de provas ou mesmo a continuidade dos supostos crimes atribuídos aos grupo.

Souza é o novo relator do habeas corpus da Operação Sangria no Tribunal de Justiça, depois que o desembargador Pedro Sakamoto se declarou suspeito para julgar o caso, já que um dos envolvidos, Luciano Correia Ribeiro, é seu médico.

“A organização tem orquestrado, in thesi, de forma célere, a obstrução das investigações desde seu nascedouro, quando tão só agia a CPI Municipal instaurada a fim de apurar as irregularidades correlatas […] atuado concretamente a fim de descontextualizar o cenário delitivo, por intermédio do remanejamento de servidores de órgãos públicos vitimados; (b) constranger testemunhas a fim de honrar o princípio da omertá que viceja organizações quejandas; (c) deletar aquivos de computadores; (d) picotar (literalmente) documentos comprobatórios da empreitada ilícita”, escreveu o magistrado.

Segundo o desembargador, as investigações concluíram ainda que os suspeitos também atuavam atrapalhando a celebração dos contratos pelas empresas vencedoras nos procedimentos licitatórios para a prestação de serviços públicos de saúde. “Rendendo ensanchas não só a situações emergenciais [emergência fabricada!], senão também a um número considerável de mortes de cidadãos que necessitam de pronto-atendimento médico e se submetem ao sistema burocrático controlado pelo grupo criminoso”.

Na decisão, o magistrado faz ainda outras críticas duras aos acusados. 

“O material probatório jungido permite entrever mais um possível episódio de extrema gravidade, como tantos outros, que, de resto, nos tempos que correm, têm gerado perplexidades em diferentes e incontáveis âmbitos da federação, pelas funestas consequencias das condutas criminosas perpretadas, geradoras de desequilíbrio social e fomentadoras de medo”, afirmou o magistrado.

Segundo Souza, este tipo de ação elimina a dignidade “de uma legião de brasileiros miserandos, assolados pelo mais absoluto descaso para com o sistema de saúde mato-grossense, dialogando casualmente com toda uma pletora de fatalidades que acomete larga parcela de desamparados que se veem sob o jugo de sub-humanos cegos pela cupidez estoica, burocratas anônimos impérvios ao sangue que borbota de suas condutas”.

As prisões

Na manhã deste sábado (30), a Polícia Civil cumpriu os seis mandados de prisão preventiva contra o grupo, que é acusado pelo esquema para monopolizou a saúde em Mato Grosso, por meio da prestação de serviços médicos hospitalares. Um dos alvos não foi localizado e ficou de se apresentar à Polícia Civil ainda neste sábado.

Foram novamente presos: o ex-secretário municipal de Saúde de Cuiabá Huark Douglas Correia, Fábio Liberali, Flávio Taques, Kednia Iracema Servo, Luciano Correia, Fábio Taques Figueireiro. E deve se apresentar a investigada Celita LIberali. Os mandados foram cumpridos em Cuiabá e Várzea Grande.

Os trabalhos são conduzidos pela Delegacia Especializada em Crimes Fazendários e Contra a Administração Pública (Defaz), presididos pelo delegado Lindomar Aparecido Tofoli.

O outro lado

A reportagem conseguiu falar apenas com a defesa de Flávio Taques. Seu advogado Anderson Nunes de Figueiredo estranhou o decreto de prisão de seu cliente. 

“A decisão é teratológica, dada de forma monocrática. O desembargador poderia esperar o colegiado decidir, já que o processo está na pauta para ser julgado, inclusive com parecer do Ministério Público Estadual”, afirmou. O julgamento do habeas corpus na Câmara Criminal deveria ocorrer na quarta-feira (27), mas foi retirado de pauta, devendo voltar na semana que vem.

“Na decisão sobre meu cliente, ele [desembargador] cita o envolvimento com Hospital Regional de Sinop, cita envolvimento com outras empresas que prestam serviços no âmbito estadual, sendo que Flávio era funcionário da Secretaria Municipal [de Saúde de Cuiabá], que não tem nada a ver com estes casos. Ele não tem nenhum vínculo com âmbito estadual. Em relação ao meu cliente, é uma decisão que foi dada sem pensar”. 

O advogado estranhou ainda o fato de a decisão ter sido dada no momento em que os habeas corpus de Flávio e de outros acusados estavam prontos para serem levados a julgamento na Câmara Criminal.

“É estranho, não é comum.  No meu entendimento, não é comum uma decisão monocrática, depois de já lançado o parecer [do MPE], ele vir monocraticamente decidir sem fatos novos, sem provocação do Ministério Público, às vésperas de ser levado novamente a julgamento”. 

 

Texto: Mídia News