Maioria vota por manter prisão de deputado; julgamento é adiado

A maioria dos desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) votou por manter a prisão do deputado estadual Mauro Savi (DEM), que está detido desde o dia 9 de maio por conta da Operação Bereré

O julgamento do recurso de Savi foi adiado nesta quinta-feira (24) em razão do pedido de vistas do desembargador Marcos Machado. Até o momento, dos 30 desembargadores, 16 votaram pela manutenção da prisão e dois pela soltura.

O caso deverá retornar para julgamento apenas no dia 14 de junho, caso o deputado não seja solto por meio de outra medida judicial.

Mauro Savi foi preso durante a 2ª fase da Bereré, que apura esquema de fraude, desvio e lavagem de dinheiro no âmbito do Detran-MT, na ordem de R$ 30 milhões, que operou de 2009 a 2015.

Segundo as investigações, parte dos valores repassados pelas financeiras à EIG Mercados por conta do contrato com o Detran retornava como propina a políticos e empresários, dinheiro esse que era “lavado” pela Santos Treinamento – parceira da EIG no contrato – e por servidores da Assembleia, parentes e amigos dos investigados.

O deputado é apontado como um dos líderes e maiores beneficiários do esquema. O Ministério Público Estadual (MPE) afirmou que ele recebia propinas milionárias através do empresário Claudemir Pereira, então sócio da Santos Treinamento. Savi ainda teria exigido R$ 1 milhão dos sócios da EIG, em 2014, para aceitar encerrar as negociações ilícitas.

No julgamento desta tarde, o relator do recurso, desembargador José Zuquim Nogueira, votou por manter a sua própria decisão e negou o recurso de Savi.

Ele foi acompanhado pelos seguintes desembargadores: Cleuci Terezinha, Serly Marcondes, Sebastião Barbosa, Nilza Maria Pôssa, Antonia Siqueira, Helena Maria Ramos, Juvenal Pereira, Márcio Vidal, Carlos Alberto Alves da Rocha, Luiz Ferreira, Clarice Claudino, Maria Erotides, Luiz Carlos da Costa, João Ferreira e Rondon Bassil.

Já os desembargadores Paulo da Cunha e Sebastião de Moraes votaram no sentido de acatar o recurso do parlamentar.

 

Versão da defesa

No recurso, a defesa de Savi constatou “incongruências” na acusação do Ministério Público Estadual (MPE). De acordo com o MPE, o delator José Ferreira Gonçalves, sócio da EIG, relatou que as primeiras reuniões sobre o esquema ocorreram em 2007, junto com o então deputado federal Pedro Henry, o ex-presidente do Detran, Teodoro Lopes, o “Dóia”, e o empresário Marcelo Costa e Silva, sócio da Santos Treinamento.

Porém, segundo o advogado Paulo Fabrinny, apenas dois anos depois o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) editou a resolução que tornou obrigatório o registro dos contratos de financiamento de veículos e, consequentemente, deu a possibilidade de o Detran-MT contratar a EIG para a prestação de tal serviço.

A defesa também citou que o delator José Ferreira disse não ter conversado diretamente com Mauro Savi e que apenas sabia que o deputado se beneficiava das propinas porque terceiros lhe diziam isso.

Outro argumento de Paulo Fabrinny é que o próprio MPE afirma que, após outubro de 2014, as alegadas propinas passaram a ser pagas ao grupo que representaria a atual gestão, no caso, o executivo José Kobori, o ex-chefe da Casa Civil, Paulo Taques, e o irmão de Paulo, Pedro Jorge Taques.

O advogado alegou que a quebra de sigilo bancário dos investigados também remonta ao período de 2009 a 2014, “isto é, a última movimentação investigada tem mais de quatro anos”.

Fabrinny ainda questionou o fato de a prisão ter sido decretada nas proximidades das eleições. Ainda no recurso, o advogado explicou que a investigação que motivou a prisão tramita desde 2012 e que, portanto, não se sustenta manter o deputado preso para não atrapalhar a produção de novas provas.

 

“Prática reiterada de crimes”

Em seu voto, o desembargador José Zuquim afirmou ser incontestável que a prisão é necessária para a conveniência da instrução do processo.

“A atuação de Mauro Savi é marcada pela dissimulação, pela sua habilidade e influência, em que mescla as ações do seu mandato com os crimes praticados. Ele atua simulando negócios jurídicos que não existem para dar legalidade às negociações criminosas”.

Zuquim mencionou que as provas apontam que Mauro Savi usou várias artimanhas para não deixar rastros da propina recebida, entre elas o de usar várias pessoas  para se camuflar, seja por elos de “confiança, por pacto de lealdade, vínculo de subordinação ou parentesco”. 

“Enquanto chefe de fato do Detran, Mauro Savi continua a orquestrar e se beneficiar de tais esquemas”.

O magistrado registrou que o deputado já é réu de outras duas ações penais no tribunal, ambas envolvendo escândalos de corrupção. 

“Isso tudo demosntra que ele se vale do poder político de deputado para a prática reiterada de crimes. Há indícios de que ele continuará na prática delituosa se for posto em liberdade. Indubitavelmente, verifica-se a necessidade da prisão preventiva do agravante”. 

Os desembargadores Juvenal Pereira e Rondon Bassil complementaram o voto de Zuquim e reforçaram o risco de Savi atrapalhar as investigações.

“Ele é useiro e vezeiro na prática dos atos de surrupiar dinheiro dos cofres públicos usando do cargo de deputado estadual. Outro fator é o contrato ter sido rescindido só em 2018, após a deflagração da Bereré. Se em liberdade, com toda a prerrogativa e influência, irá sim prejudicar a instrução processual. É um fato que impõe a restrição de sua liberdade”, disse Juvenal.

“Seríamos ingênuos se achássemos que os autores dos crimes, agora que são descobertos, não fariam nada para destruir provas. A organização criminosa está viva. O risco à instrução criminal ainda permanece, porque agora é que serão produzidas as provas que irão fundamentar uma eventual sentença condenatória ou absolutória”, afirmou Rondon.

 

“Cadê o perigo?”

Únicos até o momento a votar pela liberdade, os desembargadores Paulo da Cunha e Sebastião de Moraes afirmaram que a prisão contra Savi não possui o requisito da contemporaneidade;

Cunha disse que os fatos já são investigados há um bom tempo e que, portanto, não há perigo de a apuração ser atrapalhada, até porque a denúncia já foi oferecida. 

“Metade dos argumentos só servirão em uma eventual pena. A outra metade eu não vejo nenhum suporte para agasalhar. A denúncia já foi oferecida, não há mais investigação a ser feita. Não há o propalado perigo porque também o ex-diretor do Detran fez a delação há mais de um ano e a delação só foi homologada recentemente. Até as pedras sabiam dessa delação, bem como sabiam quem eram os delatados. Cadê o perigo? O que aconteceu da delação até o momento da decretação da prisão? Se continuaram os crimes, foi sob o aplauso das autoridades? Não tem contemporaneidade essa prisão. E não teve pressa. Não vejo aqui a contemporaneidade da prisão”, disse ele.

“Se o contrato foi rescindido em fevereiro de 2018, Mauro Savi não tem como reicindir no crime, se é que cometeu. A prisão preventiva se aplica de forma extraordinária, e não vejo essa extraordinariedade”, afirmou Moraes.  

 

A operação

A segunda fase da Operação Bereré resultou na prisão dos seguintes alvos: o deputado estadual Mauro Savi (DEM); o ex-secretário-chefe da Casa Civil, Paulo Taques e seu irmão Pedro Jorge Taques; os empresários Roque Anildo Reinheimer e Claudemir Pereira dos Santos, proprietários da Santos Treinamento; e o empresário José Kobori, ex-diretor-presidente da EIG Mercados.

De acordo com as investigações, entre os meses de julho e agosto do ano de 2009, quando Teodoro Moreira Lopes o “Dóia” ocupava o cargo de presidente do Detran, foi convocado para uma reunião no gabinete do deputado Mauro Savi. No local estavam presentes, além do parlamentar, Marcelo da Costa e Silva e Roque Anildo Reinheimer, ambos investigados no caso.

Na ocasião, Marcelo Silva e Roque Anildo teriam oferecido a Dóia a execução da atividade de registro junto ao Detran dos contratos de financiamento de veículos com cláusula de alienação fiduciária, de arrendamento mercantil, de compra e venda com reserva de domínio ou de penhor dizendo que apresentariam ao então presidente da EIG Mercados.

Conforme, o MPE, na ocasião a empresa se oferecia a formular contrato administrativo com o Detran para prestar o serviço de registro de contratos junto à entidade de trânsito. Na oportunidade, um dos sócios da empresa, a fim de garantir a prestação de serviços, teria se comprometido a repassar o valor equivalente ao pagamento de um mês às campanhas eleitorais do deputado Mauro Savi e do então governador Silval Barbosa.

Os promotores dizem que a promessa teria sido cumprida no valor de R$ 750 mil para cada um dos candidatos, logo após a assinatura do contrato.

Para que a empresa fosse a vencedora do edital, na época o antigo presidente do Detran determinou que a comissão de licitações do Detran confeccionasse o edital de licitação nos mesmos moldes que a empresa FLD Fidúcia – hoje EIG Mercados – já havia vencido no Piauí. Desde então, segundo o MPE, a empresa é responsável pelo pagamento de propinas a organização ciminosa.

Consta nas investigações que após a assinatura do contrato administrativo, “Mauro Savi, Claudemir Pereira dos Santos, Teodoro Lopes e outros investigados se organizaram a fim de garantir a continuidade do contrato, formando uma rede de proteção em troca do recebimento de vantagens pecuniárias da parte da FDL, propina na ordem de 30% (trinta por cento) do valor recebido pela FDL do Detran repassado por intermédio de empresas fantasmas que foram criadas em nome dos integrantes da rede de proteção do contrato”.

“Esquema que teve continuidade com a mudança de Governo e a participação de Paulo César Zamar Taques e seu irmão Pedro Jorge Zamar Taques”, afirmou o MPE.

Os promotores explicam que no ano de 2015 – quando Silval da Barbosa deu lugar ao atual governador Pedro Taques -, ao ter informações do esquema de recebimento de propinas operado dentro do Detran, Paulo Taques e Pedro Zamar Taques – primos do governador – apropriaram-se do esquema de recebimentos,  com ajuda de Valter José Kobori.

Em depoimento colhido junto a um dos proprietários da empresa EIG Mercados Ltda, foi revelado ao MPE que após acertar os pagamentos com a antiga gestão Silval Barbosa a EIG Mercados contratou Valter Kobori como CEO (Chief Executive Officer). Desde então seria ele a pessoa responsável em receber pessoalmente a propina sob título de bônus pelos serviços pessoais prestados a empresa e repassar o dinheiro para Paulo Taques.

Segundo o depoimento as negociações foram feitas antes mesmo do resultado das eleições de 2014 onde Valter Kobori já havia combinado com Paulo Cesar Zamar Taques o auxílio para manutenção do esquema.

Texto: Midia News