Laudo confirma que acusado de arrancar coração da tia em Sorriso tem transtorno

O segundo laudo psiquiátrico judicial de homem que assassinou e arrancou o coração da tia confirma transtorno bipolar e incapacidade de entender o caráter criminoso dos atos cometidos por ele. Lumar Costa da Silva, 31 anos, pode ser considerado inimputável pelo feminicídio de Maria Zélia da Silva Cosmos, ocorrido em Sorriso, no dia 2 de julho de 2019, o que impediria o julgamento. Ele confessou o crime em detalhes, alegando insanidade mental e está preso no Centro de Ressocialização de Sorriso.  

A perícia assinada pelo médico psiquiatra forense Rafael de Paula Giusti examinou o quadro de saúde mental do réu nos dias 19, 27 de agosto e 2 de setembro de 2021, a pedido do juiz Anderson Candiotto, da 2ª Vara Criminal de Sorriso.

O documento atesta que Lumar é acometido pelo Transtorno Afetivo Bipolar, no qual há o comprometimento do juízo, da crítica e do autocontrole do paciente, comprometimento grave e irreversível de personalidade, podendo gerar comportamento incisivo e agressivo. A análise pericial considera que o fato dele ter feito uso de substâncias alucinógenas no dia do crime contribuiu para o agravamento do quadro do humor e desenvolvimento dos sintomas psicóticos relatados.   “Diante do exposto, (…) posso definir o periciando como portador de Transtorno Afetivo Bipolar Tipo I (CID10: F31). Para o presente quadro, há a necessidade de tratamento psiquiátrico por tempo indeterminado, havendo nexo causal entre o diagnóstico, a psicopatologia apresentada e o ato cometido”, diz trecho do documento.  

De acordo com informações do laudo, a prática de crimes violentos em pacientes com transtorno bipolar é maior do que o observado na população em geral em 2,8 vezes e, quando a análise é associada ao uso de substância psicoativa, a probabilidade de cometer crimes violentos é maior 10,1 vezes em comparação com a população geral.

Questionado se o surto psicótico que gerou a ação criminosa se deu por uso da droga LSD ou por doença mental, o psiquiatra afirmou que a doença mental não tratada pode apresentar sintomas psicóticos quando há a ocorrência de uma fase de mania e, da mesma forma, o uso de LSD também pode desencadear sintomas psicóticos.  

Atualmente, o psiquiatra afirma que Lumar está com o quadro mental estabilizado e faz uso contínuo de medicação controlada.  

O crime

Lumar morava em Campinas (SP), trabalhava em uma empresa multinacional de telecomunicações e viajou de férias, em abril de 2019, para Mato Grosso, para visitar os familiares. Afirma que sentiu-se deslumbrado com o potencial de crescimento na cidade de Sorriso e seguiu com o pensamento de vir para região buscar algo novo na vida. Durante seu retorno, relata que começou a apresentar pensamentos diferentes, de que o estavam perseguindo e vigiando, chegando a quebrar celulares e notebooks por acreditar que estava sendo monitorado.

Em junho, ele pediu acerto de contas com a empresa e comprou R$ 2.500 em roupas para revender em Sorriso. Ao vir para a cidade mato-grossense, ficou uns dias na casa da vítima, sua tia, até conseguir alugar uma casa para si. Lumar chegou a pegar uma faca para atacar um vizinho que ele achava que estava provocando-o com “músicas estranhas”.

No dia do crime, Lumar estava em sua kitnet, fumou um cigarro de maconha e dormiu. Ao acordar, afirma que sentiu que precisava fazer uma meditação para “abrir o terceiro olho e ver tudo como tinha que ser visto”. Fez uso de LSD e resolveu sair de casa para comprar comida. Foi até um restaurante, se alimentou e, após isso, afirma que as vozes ficaram fortes (relata que a todo momento ouvia vozes, mas eram fracas e pouco compreensíveis), incitando-o a ir na casa da tia “pois ela era uma bruxa que estava vendendo sua alma e precisava parar com isso”.

Chegou na casa dela, estava tudo escuro e sua tia estava sentada no sofá. Quando entrou, afirma que ela estava segurando uma faca, vendo isso já foi para cima dela a agredindo. Durante luta corporal, afirma ter caído sobre ela e com isso a faca perfurou suas costelas. Diz que ficou desesperado, pensou em chamar polícia ou ambulância, mas a voz o mandou “terminar com tudo isso”, então a golpeou mais uma vez. Após isso, continua relatando a voz de comando, agora falando para arrancar o coração da mulher. Afirma que parecia que estava sendo controlado, assistia tudo mas era outra pessoa que movimentava seu corpo.

Quando contou ao médico forense como cortou o tórax da vítima, Lumar fez o gesto demonstrando o movimento em sinal de cruz, vertical no centro do tórax até abdome superior e outro horizontal torácica. Ele disse que colocou sua mão e, através da incisão, retirou o coração da vítima. Colocou-o em uma sacola plástica e saiu para levá-lo até a casa de sua prima, filha da vítima.

No trajeto de uma casa a outra, afirma que via as pessoas rindo, gritando e o aplaudindo, falando “isso mesmo, continua”. Ao chegar na casa da prima, afirma que mostrou o coração a ela e contou o que havia feito, mas ela não acreditou. Então, pegou o carro da prima emprestado com a intenção de explodir a subestação de energia da cidade, acabando, assim, com a eletricidade da região e, posteriormente, pretendia invadir a cadeia e matar todos os detentos que lá estavam. Colidiu com um dos transformadores, mas sem efeito sobre a eletricidade. Nesse momento, afirma que a voz o mandou explodir o carro, então saiu em busca de algo para iniciar o fogo. Logo a polícia apareceu, ele reagiu tentando fugir, mas foi capturado.

Defesa  

A defesa de Lumar é feita pelo advogado Dener Felizardo. Ele afirma que Lumar é réu confesso, depende de tratamento vitalício e já fez 4 exames periciais que detectam os mesmos problemas. “O que ele fez é incabido, não estava em plenas faculdades mentais, estava motivado por uma psicose, ele é réu confesso.

O que a defesa quer é que seja dado a ele o cumprimento de pena em um local adequado onde possa ser tratado, ele precisa de atendimento ambulatorial, acompanhamento psicológico. Segregar ele não será uma pena adequada, é preciso um curativo para a doença”, argumenta Felizardo.  

O laudo foi encaminhado pela Justiça para o Ministério Público se manifestar nesta quarta-feira (24).