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Por falta de vagas para menores infratores, Justiça nega 276 internações
Em 10 meses, 276 pedidos do interior para internação de adolescentes em conflito com a lei, no Centro de Atendimento Socioeducativo de Cuiabá (Pomeri), foram indeferidos. A negativa se deu por conta da falta de vagas na unidade.
Desde abril, foi determinado que a capacidade máxima do centro não seria ultrapassada e, por isso, alguns menores apreendidos foram liberados. Desde então, pelo menos 17 jovens voltaram às ruas de Cuiabá, apesar de ser reconhecida a gravidade dos atos infracionais praticados, segundo a 2ª vara especializada da infância e juventude da comarca de Cuiabá.
Assim, a internação provisória desses menores é decretada, porém, o mandado não é cumprido e um ofício é enviado para a Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh). No documento, é informado que o recolhimento não ocorreu devido a falta de vagas, conforme explica juiz da 2ª vara especializada da infância e juventude da comarca de Cuiabá e corregedor do Complexo Pomeri, Túlio Duailibi. “Entraram alguns, sim, à medida que outros foram saindo. Eu tenho que fazer esse giro e pedir o cumprimento dos mandados”, acrescenta.
O juiz observa ainda que a procura por vagas entre as unidades do Estado é muito grande e, assim, da mesma forma como os centros do interior pleiteiam espaço no Pomeri, é buscado também daqui para a região interiorana. Duailibi comenta que Sinop é um dos municípios que mais solicitam, bem como Nova Mutum “É muito cíclico. Rondonópolis também envia pedido. Eu também peço porque não coloco nem um acima da capacidade”.
Duailibi explica que a decisão de liberar o menor por falta de vagas se deu porque foi percebido que o magistrado estava tomando para si uma responsabilidade que, efetivamente, não seria dele. Contudo, a consideração de que tal medida pode contribuir com a reincidência não é descartada. “Pode ser que sim, que isso estimule a prática indevida. Porém, se eu fosse além da capacidade, estaria permitindo a superlotação e quem tem que fazer alguma coisa ficaria numa posição muito cômoda”, ressalta. Desta forma, quando o menor é apreendido e mesmo que seja decretada a internação, se não houver vaga no centro, há a liberação.
FALÊNCIA – De acordo com o magistrado, essa decisão significa a falência para a sociedade, que precisa fazer uma discussão profunda acerca do tema, bem como para o sistema, ou seja, é resultado da falta de cumprimento do poder público das obrigações naturais com a sociedade. “Se alguns fatores fossem realmente cumpridos, talvez não teríamos essa intensidade de atos infracionais. Se hoje temos uma população carcerária enorme é porque em algum momento o Estado descuidou dessas crianças e adolescentes. O reflexo vem do estado não cumprir algumas promessas constitucionais, como saúde, educação, transporte”, explana.
O juiz aponta que, para a Sejudh, o sistema socioeducativo está dentro da normalidade, porém, rebate que os pedidos de internação expedidos não vão para lá, uma vez que não há um órgão na secretaria que receba as solicitações. “Então eles não sabem como está a realidade”, aponta Duailibi. Na Capital, aproximadamente 60 menores estão internados na ala masculina, considerando internação provisória definitiva, e assim, o Pomeri atua em capacidade máxima com adolescentes tanto da Cuiabá quanto de outras cidades.
Esses números se tornaram mais preocupantes depois que um dos blocos do complexo foi demolido, devido a uma decisão judicial. O local era totalmente insalubre. Ali, ficavam internados até 20 jovens que depois acabaram sendo transferidos para outro prédio também do Pomeri.
INTERIOR – Nas outras unidades do Estado, segundo o Sindicato dos Profissionais do Sistema Socioeducativo de Mato Grosso (SINDPSS-MT), a situação também é preocupante, segundo o presidente Paulo César de Souza, tanto que há pleito de vagas aqui. Dentre elas, o sindicalista destaca Rondonópolis, onde 12 menores estão internados, enquanto que em Barra do Garças, esse número sobe para 15, igualmente como Cáceres e em Sinop, esse número a taxa fecha em 16. “Estão todas lotadas porque possuem também péssimas estruturas”, observa.
Toda essa realidade atual é o resultado de uma falta de investimentos no sistema socioeducativo por parte do poder público, uma vez que a maior atenção é dada ao Sistema Penitenciário (Sispen). Duailibi destaca que o socioeducativo tem uma conotação social muito importante, é preciso que se enxergue ali, não somente uma questão de ato infracional, de delinquência juvenil, mas também o cunho social permeado ali. Neste sentido, o magistrado reitera que o papel dos agentes socioeducativos é de extrema importância, uma vez que ali está sendo realizada a aplicação de medida socioeducativa e não de pena.
Assim, é importante que se tenha uma categoria que compreende o processo pedagógico desenvolvido ali. “Eles têm um papel fundamental porque estão em contato direto com os internos”. O SINDPSS-MT também reconhece o papel dentro do sistema, porém, aponta que os cursos que a categoria deveria desenvolver não são priorizados pela Sejudh. Em três anos, foram dois cursos, quando na verdade, deveriam ter disso 12, segundo a gestão sindical. “O agente fica mais bem preparado e consciente do seu trabalho. Somos nós que estamos na linha de frente com os adolescentes”, explica Souza.
OUTRO LADO – A Sejudh informou que o socioeducativo conta com 170 vagas no total e destas 20 estariam disponíveis, sendo metade em Cuiabá (três no masculino e sete no feminino) e o restante em Lucas do Rio Verde.
Quanto aos cursos para os agentes, informou que, nos últimos três meses, houve cursos de práticas operacionais, simultaneamente, nas unidades de Cuiabá, Lucas do Rio Verde e Rondonópolis. Como também foram realizados cursos na área de saúde e equipe técnica, para os profissionais de nível superior, nas Unidades de Cuiabá e Rondonópolis. Há previsão para a realização de cursos de qualificação e formação trimestralmente, para todas as unidades do sistema socioeducativo, para todas as carreiras que integram o sistema.
Texto: Gazeta Digital